Durante a madrugada de domingo, sonhei duas vezes com o jogo. Mas nada, nada compara o que foi aquele domingo, dia 4 de dezembro. Acordei e recebi a notícia que o Magrão tinha nos deixado. Não o vi jogando, mas conheço a história do meu time e dou muito valor aos meus ídolos. Não vive os 23 anos de fila, mas choro toda vez que vejo o gol do Basílio, como se eu estivesse lá. Isso explica o amor que temos pelo nosso time. Faz parte da minha vida. Faz parte do meu caráter. Por isso, Doutor como você mesmo quis e profetizou "quero morrer num domingo, com o Corinthians campeão", teve seu desejo realizado. Descanse em paz e obrigada!
Nunca um dia foi tão estranho. Nunca um dia: chorar de dor e de alegria. Mas, o
Doutor explica o que é esse estado de espírito. E por último, se você não consegue ser feliz com que o futebol te proporciona, Drummond explica pra você:

Bem-aventurados os que não entendem nem aspiram a entender de futebol, pois deles é o reino da tranquilidade.
Bem-aventurados os que, por entenderem de futebol, não se expõem ao
risco de assistir às partidas, pois não voltam com decepção ou enfarte.
Bem-aventurados os que não têm a paixão clubista, pois não sofrem de
janeiro a janeiro, com apenas umas colherinhas de alegria a título de
bálsamo, ou nem isto.
Bem-aventurados os que não escalam, pois não terão suas mães agravadas,
seu sexo contestado e sua integridade física ameaçada, ao saírem do
estádio.
Bem-aventurados os que não são escalados, pois escapam de vaias,
projéteis, contusões, fraturas, e mesmo da glória precária de um dia.
Bem-aventurados os que não são cronistas esportivos, pois não carecem de explicar o inexplicável e racionalizar a loucura.
Bem-aventurados os fotógrafos que trocaram a documentação do esporte
pela dos desfiles de modas, pois não precisam gastar tempo infindável
para fotografar o relâmpago de um gol.
Bem-aventurados os fabricantes de bolas e chuteiras, que não recebem as
primeiras na cara e as segundas na virilha, como os atletas e
assistentes ocasionais de peladas.
Bem-aventurados os que não conseguiram comprar televisão a cores a tempo
de acompanhar a Copa do Mundo, pois, assistindo pelo aparelho do
vizinho, sofrem sem pagar 20 prestações pelo sofrimento.
Bem-aventurados os surdos, pois não os atinge o estrondar das bombas da
vitória, que fabricam outros surdos, nem o matraquear dos locutores,
carentes de exorcismo.
Bem-aventurados os que não moram em ruas de torcida institucionalizada,
ou em suas imediações, pois só recolhem 50% do barulho preparatório ou
comemoratório.
Bem-aventurados os cegos, pois lhes é poupado torturar-se com o
espetáculo direto ou televisionado da marcação cerrada, que paralisa os
campeões, ou do lance imprevisível, que lhes destrói a invencibilidade.
Bem-aventurados os que nasceram, viveram e se foram antes de 1863,
quando se codificaram as leis do futebol, pois escaparam dos tormentos
da torcida, inclusive dos ataques cardíacos infligidos tanto pela
derrota como pela vitória do time bem-amado.
Bem-aventurados os que, entre a bola e o botão, se contentaram com este,
principalmente em camisa, pois se consolam mais facilmente de perder o
botão da roupa do que o bicho da vitória.
Bem-aventurados os que não confundem a derrota do time da Lapônia pelo
time da Terra do Fogo com a vitória nacional da Terra do Fogo sobre a
Lapônia, pois a estes não visita o sentimento de guerra.
Bem-aventurados os que, depois de escutar este sermão, aplicarem todo o
ardor infantil no peito maduro para desejar a vitória do selecionado
brasileiro nesta e em todas as futuras Copas do Mundo, como faz o velho
sermoneiro desencantado, mas torcedor assim mesmo, pois para o diabo vá a
razão quando o futebol invade o coração.